NA SALINHA ONDE ESPERAVA DUAS VEZES POR SEMANA, havia duas cadeiras, ainda com os forros protegidos pelos plásticos, que me faziam lembrar os restaurantes chineses de Lisboa. Dois quadros do Sigmund Freud e um outro já gasto, de um simpósio internacional de psicanálise qualquer, no início dos anos oitenta.
Debaixo de uma das cadeiras, aquela onde eu comecei por me sentar, um rádio, normalmente mal sintonizado numa estação de música clássica. A sala não tinha janelas e por isso nenhuma luz natural. Tinha sim um candeeiro de chão que me fazia lembrar uma flor carnívora que é para não dizer, um pipi aberto por onde saía a cabeça de um bébé: a lâmpada 20 watts, que quase não permitia ler as revistas disponíveis. Via a Caras a meia luz.
Pendurado na porta do banheiro, havia ainda algo que não sei se me desconcertava ou dispersava, ou envergonhava. Um quadrinho, de bordado ponto cruz, onde se liam as palavras: PIPI ROOM.
Infelizmente o homem em quem eu jogava todas as fichas, não tinha noção alguma de decoração. Ou pairava acima dela. Foi apostando na segunda hipótese e lutando contra os meus mais básicos preconceitos que continuei, tentando ignorar de alto, que o renomado analista sinalizava o banheiro do consultório onde me desconstruía, com um bordado ponto cruz.