CECÍLIA ENTROU NO RESTAURANTE de comida a peso com vontade de comer Torta Alemã. Havia seis meses que não cozinhava uma única refeição, mais ou menos desde que Roberto saíra de casa para ir viver com Fernanda, atriz quarentona, completamente desconhecida e por isso com muitos problemas de auto-estima. Assim Roberto lhe colocara a questão, durante as conversas em que o amor deles morria e mesmo assim ficavam satisfeitos por serem terrivelmente verdadeiros um com o outro.
Pousou a bolsa nas costas da cadeira, pegou a comanda e foi até ao buffet pensando em Roberto transando com a atriz problemática. Pensamentos que lhe davam fome de doce e não de comida de sal. Mas obrigou-se a servir-se de um pouco de salada com molho vinagrete baixas calorias e uns quadrados de tofu. Uma coisa que não sabia a nada, não a podia engordar.
Pesou o prato, oito reais, estava comendo cada vez menos e voltou à mesinha do canto do salão, de onde podia ver sem esforço a porta do restaurante.
Cecília achava que não, mas estava já enfeitiçada pelo estranho homem, de ótimo aspecto, que há quatro domingos jantava sozinho na mesinha da frente e que, sem ela notar muito bem, lhe ia acabando com a dor forte que sentia no peito, só porque tinha uns olhos que lhe pareciam de leitor e usava aquelas camisas brancas que lhe ficavam bem, especialmente na parte do corpo que distingue os homens bonitos dos outros, o pescoço.
Deixou-o acabar a refeição, demorando muito e tomando deliciada toda a Coca-Cola Zero, e depois de se satisfazer com a delícia que a levara ali e quando ele chegava com a sua fatia, fez-lhe sinal para que se sentasse no lugar vazio à sua frente.
Oi, meu nome é Cecília. Além de Torta Alemã, você gosta de outras coisas?
Ele riu e comeu um pedaço de torta e disse aquela coisa que tempos depois ainda recordariam, nas vezes em que se amavam bem.
Cecília, deixa eu te falar uma coisa. Se não passar, não é grave. É só porque não passa.